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Mercado de apostas esportivas já ganha o gosto do brasileiro

Por: O Tempo

Uma ascensão gigantesca que une paixão, marketing e a vontade de ganhar dinheiro “fácil” num cenário de instabilidade econômica. As casas de apostas esportivas fazem cada vez mais parte do cotidiano das pessoas, seja por lazer ou por estratégia de investimento, e se tornaram parte importante do orçamento dos clubes de futebol das séries A e B do Campeonato Brasileiro. Levantamento feito pela reportagem de O TEMPO mostra que 35 dos 40 principais times do País estampam alguma marca do tipo em seus uniformes. São 19 empresas diferentes. Os números reforçam a necessidade de se debater sobre o setor, ainda não regulamentado no Brasil apesar da imensa quantidade de dinheiro que movimenta anualmente.

Tudo que envolve as apostas no Brasil segue o determinado pela Lei 13.756, de 2018. O texto legaliza a operação das casas no País, mas deu um prazo de quatro anos para que a atividade fosse regulamentada. Essa validade acaba em dezembro deste ano, mas parece longe de um desfecho. Enquanto isso, as empresas trabalham na chamada “zona cinzenta”, na qual a opção por países com vantagens fiscais é regra clara. Das 19 que patrocinam clubes brasileiros, 10 se localizam em Curaçao, cinco na Costa Rica, duas em Malta, uma no Reino Unido e uma tem duas sedes, na Austrália e em Gibraltar. PUBLICIDADE

O profissional das apostas Felipe Fernandes, de 31 anos, mantém um canal no YouTube sobre o tema com quase 7 mil inscritos. Morador de BH, ele trabalha no ramo há nove anos e fundou a Associação Brasileira de Apostas Esportivas (Abaesp). Felipe defende uma regulamentação do tema, apesar de lucrar com o modelo atual. “A regulamentação é muito importante, desde que feita de uma maneira correta. Se ela for feita de uma maneira que não é correta, ela pode motivar as pessoas a buscarem o exterior (na  irregularidade), sem que o governo saiba”, pontua. 

Uma das principais discussões sobre a regulamentação gira em torno da taxação dos ganhos com apostas. Pessoas do setor e especialistas defendem que os impostos incidam apenas nos lucros das empresas, sem onerar o apostador. A avaliação é de que uma legislação desfavorável afaste as casas do Brasil. Como a demanda vai continuar independente da legislação, a ilegalidade a acompanhará se as empresas não vierem para o País. 

“Não tenho dúvida de que a tributação sobre o GGR (Gaming Gross Revenue, o lucro), não sobre o turnover (arrecadação bruta), é muito mais justa e muito mais atraente para o mercado. É muito mais atraente para trazer essas casas apostas que operam nessa zona cinzenta, sob pena de ficar insustentável. O grande desafio da regulamentação é você conseguir fazer uma legislação que torne o mercado brasileiro competitivo”, explica a advogada Mariana Chamelette, especialista em direito desportivo. 

Outra preocupação de Mariana diz respeito ao crime de lavagem de dinheiro. Especialistas indicam que parte das empresas sediadas em paraísos fiscais são usadas como manobra para driblar ganhos financeiros. “Têm dois pontos que são imprescindíveis. O primeiro se refere à necessidade de identificar o apostador e o recebedor do prêmio, para que se conheça quem é a pessoa por trás do dinheiro. Além disso, é preciso impor, para algumas pessoas jurídicas, a comunicação de informações com relação a apostadores e transações de valores à Unidade de Inteligência Financeira (UIF)”, afirma a advogada.

O coordenador acadêmico do curso de Gestão de Esporte da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Pedro Trengrouse, é mais um a defender a regulamentação. Ele fala em proteger a “economia popular” com o regramento. “A regulamentação é importante para garantir que os operadores sejam efetivamente capazes de honrar seus compromissos. Em 2017, milhares de apostadores ficaram sem receber prêmios porque as bancas não honraram apostas nos resultados da 13ª rodada da Série A, na qual times visitantes ganharam a maioria das partidas, elevando significativamente a premiação”, diz.

O professor Pedro Trengrouse e a advogada Mariana Chamelette defendem que a regulamentação brasileira siga exemplos de sucesso, como a legislação britânica. O Instituto de Comércio e Economia de Dusseldorf aponta o Reino Unido como melhor modelo tributário de jogo on-line, com imposto de 15% sobre GGR (lucro das casas) e canalização superior a 95% dos apostadores. Ou seja, menos de 5% das apostas são feitas na irregularidade. O exemplo negativo é Portugal, onde apenas 38% dos palpites são feitos na estrita legalidade.

Ganhar dinheiro exige estudos

Quem atua no mercado profissionalmente, ou seja, vive financeiramente a partir das apostas, é certeiro ao tratar sobre o tema: é preciso muito estudo e experiência para se dar bem. Não existe receita de bolo nem fórmula mágica que faça o consumidor regular virar um especialista do pitaco do dia para a noite e fazer fortuna. Gabriel Andrade trabalha no setor há seis anos e fala sobre as dificuldades de viver das apostas. 

“Desses seis anos que eu trabalho, eu me tornei lucrativo somente a partir do terceiro ano. Em meados de 2019, resolvi sair do emprego que eu tinha para me dedicar totalmente a isso e sobreviver com minha própria banca”, diz. Segundo ele, os apostadores se organizam principalmente pelas redes sociais, onde as mais diferentes modalidades entram em debate: das tradicionais até os jogos eletrônicos, passando também por esportes curiosos, como as corridas de cachorro.

“No Brasil, o cenário começou bastante criminalizado. Muita gente começou encarando como jogos de azar, não como investimento, o que dificultou muito o crescimento no começo. Mas, com o tempo, esse preconceito foi caindo. A situação econômica do nosso País (de muita instabilidade nos últimos anos) ajudou bastante no boom”, avalia Gabriel Andrade. 

O profissional das apostas Felipe Fernandes acompanha a noção trazida pelo colega. “Se você espera tirar uma quantia de dinheiro significativa, que realmente possa impactar na sua vida, você precisa levar a sério. E o mais importante é que vai levar muito tempo. Não é uma corrida de 100 metros. É uma maratona”, diz. O especialista afirma que chega a assistir 16 horas em partidas de futebol aos fins de semana para se especializar, além de ter feito um mestrado que combina computação e gestão esportiva.

O economista da Associação Brasileira de Educadores Financeiros (Abefin), Diercio Ferreira da Silva Filho, analisa a questão com mais cautela. Ele não reconhece as apostas como investimento. “Além de não ter regulamentação no País pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), a sorte está envolvida. Havendo sorte ou azar, não tendo como monitorar o risco, não tem como classificar como investimento”, alega.

Empresas investem pesado

Metade das propagandas de apostas dos 35 times das séries A e B do Brasileirão está localizada na área mais nobre das camisas: o patrocínio master, logo abaixo do escudo. Apenas o Palmeiras na Série A não tem parceria do tipo, enquanto Brusque, Grêmio, Novorizontino e Tombense resistem na B. Ainda na divisão de acesso, há casos extremos nos quais a mesma casa de apostas aparece em mais de um local do uniforme, estratégia adotada por Ponte Preta, Sampaio Corrêa e CSA. 

Em Minas, Atlético e América entram em campo promovendo as apostas no master, enquanto o Cruzeiro exibe uma marca nos ombros. Há, ainda, patrocínios nas mangas e costas entre os times das séries A e B. Num exemplo inovador, o Operário de Ponta Grossa (PR), que joga a divisão de acesso, só exibe a marca de apostas em suas redes sociais. 

Previsão da consultoria H2 Gambling Capital, especializada na área de apostas, aponta que o Brasil deve ter um crescimento geométrico em volume de negócios no setor até 2026. A estimativa é que o crescimento seja de 17% até lá, números que podem mudar drasticamente para mais ou para menos a depender da regulamentação a ser feita.

Cotação alta

Por dentro dos dados: casas de apostas esportivas dominam uniformes dos clubes brasileiros

– 35 dos 40 clubes das séries A e B (87,5%) estampam marcas do tipo 
– O Palmeiras é o único da elite sem patrocínio das “bets” na elite. Na Série B, Brusque, Grêmio, Tombense e Novorizontino também não são parceiros
– Dos 35 patrocínios, 17 são master (propaganda mais nobre do uniforme, abaixo do escudo); três são nos calções; quatro nas costas; seis nas mangas, quatro nos ombros e um nas redes sociais
– São 19 marcas diferentes com propaganda nos clubes da primeira e segunda divisões. A Pixbet patrocina 10 clubes, entre eles Cruzeiro e América
– 52,6% das casas de apostas com patrocínio nas séries A e B estão sediadas em Curaçao

Fonte: Levantamento feito pela reportagem com base nos sites oficiais dos clubes

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